segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Oncogenetica




Orientada para prevenção, a oncogenética busca identificar fatores hereditários que possam contribuir para o desenvolvimento do câncer

Por Paulo Paladino

Ainda que somente de 5 a 10% dos casos de câncer estejam relacionados a genes transmitidos de pai para filho, a busca de alterações genéticas que possam detectar o desenvolvimento de um tumor hereditário, antes que os sintomas se manifestem, representa um grande benefício para pacientes e para seus familiares.

Por meio do aconselhamento genético, é possível avaliar famílias com múltiplos casos de câncer a fim de descobrir se existe um fator genético que as predispõem à doença. “Esse é um processo que deve ser realizado por uma equipe multi-profissional, desde o próprio oncogeneticista até pediatras, cirurgiões, assistentes sociais, e psicólogas”, explica Benedito Mauro Rossi, membro e presidente-fundador do GBETH, Grupo Brasileiro de Estudo de Tumores Hereditários.

Quem procura o serviço geralmente suspeita que, por possuir um número considerável de parentes próximos que tenham enfrentado a doença, poderá também desenvolver um tumor.

A primeira etapa é, então, a investigação detalhada do histórico de câncer na família (análise de, no mínimo, duas gerações) através de atestados de óbito, exames e conversa com familiares. Desse modo, é montada uma árvore genealógica, ou heredograma, na qual todas as características inseridas são posteriormente analisadas objetivamente com base no procedimento preconizado pela Rede Nacional de Compreensão de Câncer (NCCN), envolvendo, assim, precedentes, relação dos tipos de câncer, idades em que apareceram etc.

O procedimento adotado pelos especialistas do Hospital do Câncer de São Paulo, local onde o serviço é realizado desde 1999, estabelece ainda uma etapa anterior para aqueles pacientes do hospital que identificaram um tumor. Eles são encaminhados para o departamento de Oncogenética, onde são abordados todos os dados pertinentes à análise individual: etnia (para avaliar a possibilidade de mutações específicas dentro de um grupo particular), exposição ambiental, história prévia e atual do paciente. Nesses casos, o histórico familiar é a continuação do processo iniciado individualmente. “O processo de aconselhamento do hospital é bastante simples, o único problema foi reunir todas as informações necessárias”, comenta Vera Lucia Rosa, ex-paciente do AC Camargo.

“Mas essa é só uma fase de investigação”, explica Benedito Rossi. Uma vez que se chega a conclusão de que existe uma predisposição genética e tais fatores hereditários são realmente comprometedores, o trabalho de orientação segue em duas frentes: a prevenção primária, isto é, mudanças de hábitos que aumentam risco de câncer naquela família, tais como tabagismo, dieta e exercícios; e a prevenção secundária que são os exames de imagem e laboratoriais que tem intuito de diagnosticar lesões em estágios iniciais e, em alguns casos, prevenir o aparecimento dos tumores.

“Uma determinada família com o diagnóstico de Síndrome de Lynch tinha alto risco de desenvolver tumor no cólon e reto, endométrio e estômago”, conta Maria Isabel Achatz, chefe do departamento de Oncogenética do Hospital do Câncer de São Paulo. O paciente índice, do sexo masculino, havia desenvolvido um tumor colorretal aos 41 anos e, por isso, todos os familiares que tinham o mesmo risco haviam sido convidados para uma consulta na qual a oncogeneticista pôde esclarecer informações sobre a herança genética, bem como características e riscos de desenvolvimento da doença. No retorno, um dos irmãos do paciente índice trouxe a colonoscopia solicitada e dois pólipos adenomatosos, uma lesão benigna e precursora de câncer tinha sido encontrada. “Como é possível retira-los durante a colonoscopia, conseguimos prevenir a evolução de uma lesão que poderia se transformar em um câncer colorretal”, explica, ao reafirmar que, apesar da pessoa que procura o serviço geralmente ser o indivíduo afetado pela doença genética, é importante que todos os membros tenham conhecimento das recomendações, mesmo que seja por folhetos educativos.

Além do Hospital AC Camargo, do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e do Hospital de Clínicas de Ribeirão Preto, que são centros de Oncogenética, também a Divisão de Genética do Inca possui um programa de aconselhamento genético em câncer. “A intenção da área de Divisão Genética do instituto é criar ainda uma rede de instituições públicas para homogeneizar e desenvolver um critério padronizado de estudo de doenças de câncer hereditário”, explica Hector Seuánez, diretor da Divisão de Genética do Inca. Segundo ele, estendendo o projeto por meio de centros que forneçam aconselhamento genético e exames de laboratório será possível realizar análises epidemiológicas, além de diminuir as diferenças regionais.

Entenda Melhor

Câncer hereditário
Casos de câncer que ocorrem devido a presença de alterações hereditárias que são responsáveis pelo aumento do risco na família.

Câncer familiar
Quando muitos indivíduos de uma família apresentam variados tipos de câncer mas que não se observa uma correlação óbvia. Por exemplo, uma geração toda da família é acometida por um tumor; a próxima geração não é acometida por tumores, e depois a próxima volta a ter o mesmo tipo de câncer. Para isso, existem três explicações: ainda não surgiram outros casos de câncer que caracterizarão uma síndrome, polimorfismos (variações normais dos genes) ou desconhecimento dos genes alterados.

Quem deve procurar o oncogeneticista
Indivíduos os famílias que apresentem as seguintes características:

-Idade jovem: Tumores de mama, por exemplo, ocorrem na pré-menopausa
-Mais de um tumor primário em um único indivíduo
-História familiar de tumores semelhantes
-Tipos histológicos específicos relacionados a tumores pouco freqüentes na população, como o carcinoma medular de tireóide

Revista ABCâncer Edição nº 53 - Out 2009
http://www.abcancer.org.br/portal/index.php?module=publicacoes&class=revista&event=materia&id_materia=282

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